Envelhecendo
na cidade
Dona Ercília, de 79 anos, vive no extremo da zona sul de São Paulo. Dona Maria, com 60 e alguns, mora em um apartamento de 97 m² na Vila Mariana. Apesar da distância entre as casas e as idades, as duas senhoras têm algo em comum: ambas sustentam sozinhas seus próprios lares e são completamente independentes. Seu Ernesto, um tradutor de 67 anos, vivia como as duas, até que complicações de saúde o levaram a contratar um cuidador.
Simone de Beauvoir dizia, já nos anos 70, que nós não entendemos a velhice até que sejamos velhos. A afirmação da filósofa francesa pode explicar em partes o porquê de, apesar de este ser um tema tão decisivo na sociedade, pouco falamos sobre o assunto.
Dados recentes do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que o Brasil caminha para um envelhecimento de seus municípios. Os resultados da última Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) mostram que o grupo etário que mais cresceu na população brasileira foi o de idosos.
Em 2004, eles representavam uma fatia de 9,7% da nossa sociedade. Dez anos depois, em 2014, esse número subiu para 13,7%. E as projeções do IBGE indicam que já em 2060, um a cada três brasileiros terá ao menos 60 anos de idade.
E não é só a faixa etária do Brasil que está mudando: o comportamento dos seus habitantes também está. O crescimento dos cidadãos em idade mais avançada ocorre em um contexto de transformações nas famílias, explica Ana Amélia Camarano, pesquisadora do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) no livro “Cuidados de Longa Duração para a População Idosa”.
Segundo a pesquisadora, hoje as pessoas têm menos tempo para cuidar dos familiares idosos. Isto porque, com a queda da taxa de fecundidade e o ingresso maciço das mulheres no mercado de trabalho, os cuidados com este grupo populacional, que era atribuído no passado às donas de casas e aos membros mais novos da família, vêm diminuindo.

Essa mudança nas relações familiares resultou em um conflito de necessidades: se por um lado há mais idosos, e estes estão vivendo por mais tempo, por outro a oferta de tempo e cuidados por parte da família diminuiu, uma equação que resulta em um problema significativo: sem a possibilidade de viver da forma com que estavam acostumados antes, como vivem e como viverão esses idosos?
Histórias como as de Ercília, Maria e Ernesto tendem a aumentar. Morando sozinhos, com cuidadores ou em instituições de longa permanência (ILPIs), os idosos se adaptaram às mudanças na sociedade e estão alterando a sua forma de morar.
E o que São Paulo tem a ver com isso?
Na maior cidade do Brasil, essa realidade se intensifica. Em 2010, para cada 100 crianças na faixa etária de 0 a 14 anos havia 57,25 idosos, e, de acordo com o Ministério Público de São Paulo, em apenas um ano, de 2015 para 2016, aumentou em 39% o número de ILPIs privadas na capital paulista.
Assim, se o envelhecimento está afetando a moradia na terceira idade, São Paulo terá que se planejar para o futuro próximo. E nada melhor para entender a São Paulo +60 do futuro, do que analisar o contexto em que vivem esses idosos no presente.
